Julio Libman e Jesús Ramón Giraudo
A perda de peso corporal é uma manifestação clínica de inúmeros processos patológicos que podem levar à diminuição da massa ponderal por vários mecanismos. A perda de peso de mais de 10 quilos geralmente está associada a mudanças marcantes na aparência física e pode levar a manifestações de desnutrição. A caquexia é definida como uma diminuição do peso superior a 40% abaixo do normal em relação ao sexo, idade e altura. A perda de peso secundária, ao contrário da magreza constitucional, pode ser acompanhada por astenia e fatigabilidade, pressão arterial baixa, insônia ou sonolência, depressão, distúrbios menstruais, redução do tecido celular subcutâneo e atrofia muscular. Na caquexia essas manifestações adquirem maior magnitude, agregando hipoproteinemia e depressão do mecanismo imunológico.
Fisiologia e fisiopatologia
Em pessoas normais, a estabilidade do peso é mantida porque a ingestão é equilibrada com o gasto calórico pela ação coordenada dos centros de alimentação e saciedade, localizados no sistema nervoso central. O gasto energético é dividido em três categorias: 1) calorias necessárias para manter o metabolismo basal, definindo assim a necessidade calórica total com o corpo em decúbito dorsal e imóvel. Em outras palavras, é a energia necessária para manter a integridade funcional e estrutural do organismo na ausência de atividade física. Aproximadamente 50% das calorias diárias são consumidas neste processo; 2) calorias necessárias para a absorção dos alimentos, a chamada ação dinâmica específica, que envolve 10% da ingestão total em indivíduos não obesos e ativos.
O organismo é composto por quatro compartimentos principais: o protoplasma, que representa a partir de 30 a 35 kg, o líquido extracelular com 15 a 16 kg, o tecido ósseo com 4 a 5 kg, e o tecido adiposo, que compreende de 14 a 18 kg. Os três primeiros compartimentos representam a massa magra, que constitui 75 a 80% do peso corporal. O restante corresponde ao tecido adiposo, que desempenha importantes funções energéticas, endócrinas, metabólicas e térmicas.
A perda de peso é determinada por um balanço negativo entre a ingestão e o gasto calórico. A perda de peso pode refletir uma diminuição na massa do tecido ou no conteúdo líquido do corpo. Um declínio rápido mais provavelmente indica o último. Nesse sentido, três circunstâncias podem ser distinguidas: 1) diminuição da ingestão de alimentos e líquidos; 2) aumento do gasto calórico e 3) perda excessiva de nutrientes e líquidos.
A perda de peso pode ser, em múltiplas circunstâncias, o resultado da combinação de dois ou mais desses mecanismos. Às vezes, a perda de peso devido à diminuição da massa do tecido é disfarçada pela retenção simultânea de fluidos, como ocorre no paciente com cirrose que desenvolve ascite ou na anorexia nervosa devido ao edema concomitante.
Causas da perda de peso
A perda de peso, além de diminuir voluntariamente a ingestão e / ou aumentar a atividade física, pode ser causada por uma série de causas, incluindo:
- Doenças endócrinas. Elas incluem a doença de Addison e, eventualmente, o pan-hipopituitarismo, atribuível nessas circunstâncias à anorexia causada pela deficiência de cortisol. O exemplo mais frequente e característico é dado pelo hipertireoidismo. Nesse caso, ocorre um aumento concomitante da ingestão calórica, que às vezes pode levar ao ganho de peso, porém, ao grande aumento do gasto calórico devido ao aumento da taxa metabólica e da atividade motora. O hormônio tireoidiano produziria um aumento na atividade da ATPase de sódio e potássio em diferentes tecidos, o que sugere que a diminuição da eficiência das calorias ingeridas seria devido a ciclos fúteis de síntese e degradação do ATP com perda de energia na forma de calor.Hipercalcemia grave, por meio de anorexia, náusea, vômitos e poliúria que ela produz também resultam em perda de peso.
- Diabetes mellitus. A perda de peso pode ser devida em parte à diurese osmótica induzida pela glicosúria. Também pode ocorrer principalmente no diabetes insulinodependente, devido à perda calórica por meio da glicosúria e deficiência de insulina que resulta em menor síntese e maior catabolismo de gorduras e proteínas. Exceto em estados de cetoacidose, a perda de peso está frequentemente associada à polifagia. A diminuição do uso de carboidratos causa um estado de carência de hidrocarbonetos e, por um mecanismo não totalmente esclarecido, os centros hipotalâmicos são afetados, o que induz um aumento na vontade de comer.
- Tumores. A perda de peso, às vezes sem sintomas concomitantes e sem causa aparente, é uma das manifestações clássicas da existência de uma neoplasia. O sistema digestivo é o local mais comum de desenvolvimento de câncer oculto. Outros pacientes com tumores malignos apresentam perda ponderal associada a outros sinais e sintomas que relatam patologia grave. Vários motivos podem determinar a perda de peso no câncer avançado, como anorexia (ligada, entre outros fatores, à acidose, dor de depressão crônica), náuseas, vômitos e hipermetabolismo. Em algumas doenças malignas, especialmente nos linfomas, há diminuição da absorção intestinal. Quando ocorre sangramento, ocorre depleção de ferro, eletrólitos e proteínas. Ulcerações e infecções agravam o quadro.
- Doenças da boca e da faringe. Isso inclui lesões dolorosas na boca, como as causadas por deficiências de vitaminas, doenças do tecido conjuntivo, candidíase, gengivite difenilhidantoína e envenenamento por metais pesados. Doenças neurológicas que alteram a capacidade de mastigar e engolir, como acidentes vasculares cerebrais, distrofias musculares e esclerose lateral amiotrófica, também causam perda de peso. O mesmo ocorre com a falta de dentes e próteses dentárias móveis, que alteram a ingestão de nutrientes.
- Doenças gastrointestinais. Dentre as patologias que ocasionam o emagrecimento estão: a) esteatorréia por esprue, pancreatite crônica ou fibrose cística, porém, o aumento da ingestão que pode ser observado; b) diarreia crônica por parasitas ou doenças inflamatórias intestinais; c) doenças do esôfago com obstrução, disfagia e refluxo; d) hepatite aguda e crônica, cirrose.
- Infecções. Elas incluem tuberculose, micoses, endocardite bacteriana e abscessos amebianos. Os mecanismos seriam a anorexia e o aumento da demanda metabólica induzida pela infecção.
- Doenças psiquiátricas. A perda de peso pode ocorrer em estados depressivos e esquizofrenia; o exemplo mais característico é a anorexia nervosa, que geralmente ocorre em adolescentes e mulheres jovens.
- Doenças renais com uremia. A anorexia é uma das primeiras manifestações de insuficiência renal, que pode contribuir para a perda de peso.
- Caquexia cardíaca. Na insuficiência cardíaca grave, pode haver perda de peso e caquexia atribuíveis a vários fatores: a) aumento do metabolismo, devido ao aumento do trabalho dos músculos respiratórios e ao aumento da demanda de O2 pelo coração hipertrofiado; b) anorexia, náuseas e vômitos por causas centrais ou por congestão hepática e sensação de plenitude no abdômen e c) alteração da absorção intestinal por estase venosa.
- Fatores socioeconômicos. A desnutrição é frequente em países da América Latina e, por sua vez, em idosos que moram sozinhos e em pacientes que seguem dietas incompletas prescritas por médicos ou impostas pela moda. Perda de peso induzida pela ingestão de álcool e drogas que não são acompanhadas por uma ingestão adequada de nutrientes.
- Medicamentos. Digitalis e anfetaminas, entre outros, induzem a anorexia.
Metodologia de interrogatório e diagnóstico
No decorrer do interrogatório, serão recolhidos dados sobre o peso máximo correspondente à idade adulta, o peso anterior da doença, o peso atual e o tempo decorrido desde que foi constatada a diminuição da massa ponderal. A existência de polifagia ou anorexia, vômito, diarreia ou alterações nos movimentos intestinais, poliúria, tosse, dispneia, expectoração, hemoptise, dor torácica ou abdominal, estranhezas alimentares, ansiedade ou depressão, uso de medicamentos e presença de sintomas de hipermetabolismo, como febre, transpiração, palpitações, tremores, etc. Como a perda de peso é uma manifestação inespecífica e comum a um grande número de doenças, o questionamento deve ser completo e sistematizado. A metodologia de diagnóstico, pelos mesmos motivos, será orientada de acordo com a impressão diagnóstica decorrente do interrogatório e do exame físico. Assim, por exemplo, a existência de emagrecimento com febre, dor no peito, expectoração hemoptoica e transpiração profusa orienta a pesquisa em tuberculose pulmonar (radiologia, exame de escarro). A presença de desconforto abdominal e alterações do hábito intestinal obriga a busca por uma neoplasia digestiva (laboratório, radiologia, ultrassom, exames endoscópicos). Os sintomas de hipermetabolismo, como taquicardia, tremor, nervosismo e presença de bócio, levam ao hipertireoidismo (captação de 131I, dosagem de tiroxina e triiodotironina). A associação da perda de peso com poliúria e polidipsia força a descartar diabetes mellitus (glicemia, glicosúria). Caso não seja encontrada, por meio de questionamento e exame físico, causa que explique a perda de peso, o estudo a ser realizado deve incluir: hemograma completo, hemossedimentação. Uremia, ionograma, exame de urina, dosagem de tiroxina e triiodotironina, curva de tolerância a glicose, exame parasitológico e de sangue oculto na matéria fecal e um par radiológico do tórax (testa e perfil). Se o sintoma permanecer sem explicação lógica, devem ser considerados os seguintes estudos: PPD, exames sorológicos (reação ao látex, VDRL, células LE, fator antinúcleo), proteinograma por eletroeforese e imunoeletroforese, estudos hormonais para descartar doença de Addison, hipopituitarismo, feocromocitoma e hiperparatireoidismo, exames radiológicos gastrointestinais, do trato urinário e ósseos, estudos de radioisótopos.
Fundamentalmente, a evolução do paciente deve ser acompanhada de perto, com cautela para quaisquer sinais ou sintomas que possam se acrescentar ao quadro clínico. Nesse sentido, é importante contar com a colaboração do paciente, que deve ser informado pelos motivos dos estudos solicitados.