Jose Luis Fedele
As anemias hemolíticas são caracterizadas por uma destruição acelerada dos glóbulos vermelhos da circulação geral, devido ao encurtamento de sua sobrevida normal de 120 dias.
Os processos hemolíticos costumam ser contrariados com o aumento da eritropoiese, que é proporcional à intensidade da destruição eritrocitária e que, em alguns casos, se não for muito intensa, pode compensar e prevenir o aparecimento da anemia.
O mecanismo fisiopatológico consiste, na maioria das vezes, em uma eliminação acelerada por mecanismos fisiológicos (macrófagos), o que é denominado hemólise extravascular. Esse processo geralmente é crônico e é acompanhado por esplenomegalia.
Outras vezes, pelo menos, o mecanismo de destruição é intravascular, geralmente mais agudo e acompanhado de hemoglobinúria.
O diagnóstico da anemia hemolítica costuma ser difícil, devido ao grande número de patologias que podem desencadear essas condições, e requer habilidades clínicas avançadas e conhecimento da fisiopatologia.
Em geral, os processos hemolíticos apresentam um comportamento clínico e biológico particular, que, independentemente de sua etiologia, é semelhante em todos os casos.
Ressalta-se que os dados laboratoriais obtidos para o estudo da anemia hemolítica devem ser norteados por uma anamnese cuidadosa e exame físico detalhado, pois existem situações que podem ser confundidas com uma síndrome hemolítica.
O único procedimento laboratorial que permite confirmar a existência de anemia hemolítica sem dúvida é a determinação da meia-vida eritrocitária.
O problema com essa técnica é que ela é extremamente trabalhosa, incômoda para o paciente e não está disponível na maioria dos centros.
O método mais utilizado para determinar a meia-vida eritrocitária é a marcação dos eritrócitos com cromo radioativo (51Cr). Após a marcação, eles são reinjetados no paciente e extrações seriadas são realizadas a cada 3 a 4 dias por no mínimo 20 a 25 dias, medindo a radioatividade residual a cada vez. A meia-vida eritrocitária corresponde ao tempo em que a radioatividade cai pela metade.
Em um indivíduo normal, a meia-vida é de 25 a 32 dias, o que não corresponde à real por questões técnicas.
Para seu estudo, as anemias hemolíticas são divididas em dois grandes grupos:
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Sintomas e sinais
As manifestações clínicas de uma Síndrome Hemolítica dependem da velocidade de instalação do quadro (Agudo ou Crônico) e de sua intensidade.
Como ambos dependem da causa que o origina, o quadro pode variar desde uma apresentação assintomática até uma anemia grave que requer transfusão.
Anemia Hemolítica Aguda
São fotos que aparecem abruptamente em sujeitos, em geral, previamente saudáveis.
São caracterizados por sintomas muito florais: febre, palidez acentuada, cansaço intenso, palpitações, dispneia aos esforços moderados ou pequenos e eventualmente emissão de urina escura.
A urina escura se deve, nesses casos, à eliminação da hemoglobina livre (hemoglobinúria), produto da hemólise intravascular, e não à eliminação dos pigmentos biliares.
Se a anemia for de intensidade suficiente, podem surgir distúrbios de consciência, até perda de consciência, insuficiência renal e choque hipovolêmico grave com risco para a vida do paciente.
Se for um jovem com histórico de ingestão recente de drogas, pode-se pensar em deficiência de G6PD ou hemoglobinas instáveis.
Em um paciente adulto, é provavelmente um fenômeno adquirido de natureza imunológica.
Anemia Hemolítica Crônica
Sua instalação é lenta e progressiva e pode levar ao aparecimento de fenômenos compensatórios. Por esse motivo, a expressão clínica costuma ser menos evidente que a forma aguda e pode variar de formas assintomáticas a anemias moderadas a graves.
O exame físico mostra palidez moderada e icterícia, sendo comum a esplenomegalia, se o tempo de evolução permitir.
O aparecimento de icterícia nestes casos deve-se ao aumento da forma "indireta" ou "não conjugada", por isso NUNCA é acompanhada de colúria (icterícia acolúrica) e prurido, exceto quando coexiste com doença hepato-biliar.
Como nas formas agudas, quando ocorre em crianças ou jovens, é mais provável de origem congênita, por isso é importante indagar sobre a história familiar. Em sujeitos adultos, deve-se primeiro pensar em um processo adquirido.
Dada a natureza crônica dessas anemias, os sintomas tendem a ser mais decorrentes de complicações do que da própria síndrome hemolítica.
As complicações devido à hipóxia crônica são especialmente evidentes em anemias muito graves com início precoce na vida (talassemia maior e doença falciforme); e consistem em atraso no desenvolvimento ósseo e no crescimento corporal, atraso no desenvolvimento gonadal, úlceras de tornozelo.
Esses tipos de complicações costumam ser acompanhados pelos efeitos do aumento crônico da eritropoiese, que determina as deformações ósseas do esqueleto devido à expansão do tecido hemopoiético. Essas deformações são especialmente evidentes no crânio e na face (turricefalia, facie mongolóide, implantação anômala dos dentes, etc.). Às vezes, a expansão excessiva do tecido hematopoiético pode produzir verdadeiros tumores que podem causar compressão do canal medular.
Outras complicações da eritropoiese excessiva podem ser alterações no metabolismo do ferro e do folato. O intestino aumenta a absorção de ferro como consequência do aumento dos sinais da medula. Isso pode causar o parto de hemocromatose em indivíduos geneticamente predispostos.
Por outro lado, as reservas de folato podem ser facilmente esgotadas pelo hiperconsumo.
No contexto da anemia hemolítica crônica, uma “crise megaloblástica” pode se desenvolver como consequência da deficiência de folato, o que pode agravar significativamente o quadro clínico.
A crise megaloblástica não deve ser confundida com uma “crise aplástica” ou “eritroblastopenia” muito mais aguda.
Este último é caracterizado por queda acentuada da hemoglobina, acompanhada de intensa reticulocitopenia. Na medula óssea, pode-se observar um quase desaparecimento dos precursores eritroides, com a presença de eritroblastos gigantes isolados (pró-eritroblastos gigantes), o que indica uma parada da maturação desde estágios iniciais.
A crise de eritroblastopenia está associada à infecção pelo Parvovírus B19, que causa erupção cutânea na infância e poliartrologia em adultos.
O efeito do vírus é atribuído a uma inibição dos precursores eritroides mais maduros com menor ação sobre os mais imaturos.
As complicações podem surgir como consequência do hipercatabolismo da hemoglobina, como cálculos biliares, que no caso das anemias congênitas é observada em pessoas jovens.
Finalmente, pode aparecer um estado de hiperesplenismo, que condiciona a plaquetopenia, a leucopenia ou o agravamento da anemia subjacente.
Metodologia de estudo
O laboratório, como em toda hematologia, é de vital importância na determinação das anemias hemolíticas, mas deve sempre ser orientado por uma história clínica detalhada.
As análises que determinam a magnitude da anemia são combinadas, mostrando sinais de destruição celular e aumento da eritropoiese
Do ponto de vista geral, o hemograma completo, é claro, com a medição dos índices eritrocitários, é de grande importância. A anemia hemolítica geralmente é macrocítica devido à presença de reticulocitose (VCM> 95).
O MCHC adquire importância na Esferocitose Hereditária, onde está caracteristicamente aumentado e é um importante índice diagnóstico.
Como mencionado anteriormente, a medida da meia-vida eritrocitária é a única análise que confirma a presença de hemólise, mas como não é muito viável na prática clínica, outros métodos são utilizados.
A hiperbilirrubinemia indireta é uma característica da hemólise.
A hiperbilirrubinemia está associada ao aumento do estercobilinogênio fecal
O aumento do LDH sérico é devido à liberação da fração 2 (isoenzima 2) dos eritrócitos destruídos. Na anemia megaloblástica com eritropoiese ineficaz, a LDH também aumenta, mas em sua fração-1.
Uma diminuição da haptoglobina é um sinal muito sensível de destruição dos glóbulos vermelhos periféricos. Infelizmente, não é específico, pois também pode descer na anemia megaloblástica (eritropoiese ineficaz).
Haptoglobina é uma glicoproteína B-2, que se liga à hemoglobina livre no plasma.
O complexo Haptoglobina-hemoglobina é degradado no fígado e constitui um mecanismo para retardar a eliminação da hemoglobina livre pelo rim.
A determinação da hemoglobina glicosilada tem algum valor, pois é freqüentemente diminuída na hemólise.
A medição da hemoglobina livre no plasma pode ser usada para confirmar a presença de hemólise intravascular. Quando o nível de hemoglobina excede um valor de limiar renal, a hemoglobina aparece na urina (hemoglobinúria).
Se o processo hemolítico for crônico, a eliminação de pequenas quantidades de hemoglobina pode ser parcialmente reabsorvida pelos túbulos renais.
O ferro se acumula nas células tubulares na forma de hemossiderina e isso pode ser medido na urinálise com a coloração de Perls (hemossiderinúria).
O aumento da eritropoiese é medido principalmente pelos reticulócitos. A contagem de reticulócitos não serve apenas como ferramenta diagnóstica, mas também como acompanhamento da anemia hemolítica. Assim, a resposta ao tratamento é seguida por uma diminuição na contagem de reticulócitos, e uma recidiva é precedida por uma elevação da mesma. A diferença e a importância da ausência de aumento de reticulócitos característico da eritroblastopenia aguda secundária à infecção pelo Parvovírus B19 já foi mencionada.
É vital, dadas as várias causas da anemia hemolítica, realizar uma anamnese completa e um exame físico detalhado.
De acordo com a tabela acima, o raciocínio deve partir da premissa de inicialmente dividir as anemias hemolíticas em congênitas e adquiridas.
A divisão aguda ou crônica também serve para orientar o diagnóstico.
Em adultos, os adquiridos devem ser descartados em primeira instância. Uma vez descartados, serão iniciados estudos de busca de patologias congênitas.
A tabela a seguir apresenta as diretrizes para o diagnóstico etiológico das anemias hemolíticas.
DIRETRIZES PARA O DIAGNÓSTICO DE ANEMIAS HEMOLÍTICAS
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